A prevalência de sintomas e quadros depressivos e de ansiedade são altas entre pacientes que possuem alguma doença inflamatória intestinal (Doença de Crohn (DC) e Colite Ulcerativa (COU)), e a comorbidade entre essas condições psicológicas e as que afetam o ambiente intestinal piora a qualidade de vida e o curso da doença crônica. Quando a DII está ativa, os sintomas depressivos são mais expressivos do que nos momentos de remissão.
Porém, mesmo em remissão, a prevalência desses sintomas entre os pacientes com Doença de Crohn e Colite Ulcerativa é maior do que o esperado na população em geral. E o mesmo acontece com os sinais de ansiedade. Medicamentos e outros tipos de tratamento envolvidos no manejo das DII também parecem exacerbar os sintomas de depressão e ansiedade observados nesse público.
Não se sabe muito bem qual é a direção entre causa - consequência entre essas doenças, ou seja, o que vem primeiro. Sabe-se que o estresse psicológico é um fator de risco para DII devido aos impactos negativos que causa na motilidade, secreção, sensibilidade visceral e integridade da barreira intestinal, assim como na resposta imune – aspectos envolvidos na patogênese das condições que afetam o intestino. Porém, ao mesmo tempo, os marcadores pró-inflamatórios comumente elevados na DC e na COU contribuem para o surgimento e/ou exacerbação de sinais e sintomas psicológicos, como os de ansiedade e depressão. Tais fatos estão intimamente relacionados com a comunicação bidirecional que ocorre entre o ambiente intestinal e o cérebro, através do conhecido “eixo intestino - cérebro”.
A partir desse eixo, o que acontece no intestino influencia as respostas neurais. E o comportamento cerebral manifestado em resposta ao estresse é capaz de produzir alterações no funcionamento do trato gastrointestinal, piorando os sintomas das DII. Entre os mecanismos envolvidos podemos citar alguns, como:
A ativação de células do sistema imune, como os mastócitos, que funcionam como “efetores” desse eixo e liberam uma série de mediadores no intestino, induzindo a hiperpermeabilidade intestinal e ativação do sistema imune da mucosa intestinal;
Inibição do nervo vago, que quando ativo parece ter um papel anti-inflamatório a partir da atenuação da resposta inflamatória sistêmica a endotoxinas (que adentram o organismo quando a função de barreira do intestino está comprometida e estão associadas com quadros de endotoxemia e meuroinflamação);
Alterações na microbiota, visto que o estresse psicológico pode gerar alterações na colonização microbiana, e como os microrganismos atuam como mediadores no eixo intestino-cérebro, essa mudança de composição pode gerar disfunções na atuação desse eixo.
À medida que essas alterações relacionadas ao mal-estar psicológico afetam o intestino, se instala um ciclo em que as DII e a depressão e ansiedade se retroalimentam: a inflamação piora os sintomas psicológicos que, por sua vez, pioram a inflamação, que piora os sintomas psicológicos e assim sucessivamente.
Um dos principais eixos na ligação entre o ambiente intestinal e o cerebral, é justamente o que “controla” as respostas fisiológicas ao estresse, o eixo hipotálamo - pituitária - adrenal (HPA). O eixo HPA sofre uma espécie de programação logo no início da vida, e eventos traumáticos nesse momento da existência podem gerar estímulos que alteram as suas respostas para um perfil que, ao longo da vida, está relacionado a uma resposta imune mais reativa, que por sua vez, é a base da patogênese das DII.
Dessa forma, pacientes com sinais e sintomas psicológicos, principalmente aqueles resultantes de experiências na infância, devem ter sua saúde intestinal constantemente rastreada, e tal rastreamento também deve ocorrer nos parâmetros mentais de indivíduos já diagnosticados com alguma doença inflamatória intestinal.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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